História da Coréia 2
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História da Coréia 2

Atualizado: 23 de jul. de 2021

Olá pessoal! Hoje iremos falar sobre um período que se estende do século VI, VII e VIII d.C. Veremos que haverá avanços dos chineses principalmente quando se apresenta uma estabilidade política dinástica, nesse período considerado da dinastia Tang, o enfraquecimento do Reino do norte da península coreana que é Koguryo, e a ascensão do Reino de Silla que praticamente vai envolver toda a península já no final desse período.

Veremos também que surgirá já algumas obras, tendências, literatura, valores e a incorporação do budismo e do confucionismo na corte de Silla, também veremos como que a apresentação de personagens considerados como por exemplo Hyecho um grande peregrino coreano que vai em busca das escrituras a budistas na Índia e ele chega inclusive a entrar em contato com terras árabes no século VIII, e é considerado então um dos principais viajantes peregrinos budistas do século VIII.

Hyecho
Hyecho

Então continuando, o Hyecho talvez seja uma das figuras mais a emblemáticas desse período no envolvimento coreano nas tendências do budismo, de contatos e rotas internacionais ele traz escrituras, traz ensinamentos budistas sagrados, a trajetória longa da viagem dele inclusive vai figurar até hoje com um grande acontecimento, um personagem histórico.

Viagens de Hyecho

Agora, inicialmente, vamos voltar aos acontecimentos mais políticos, temos que levar em consideração que há sempre uma relação delicada com relação aos chineses na Coreia. No final do século VI com a ascensão de uma dinastia nova e centralizada na China que foi a dinastia Han, e um dos seus imperadores, Yang, ele começa a considerar então pôr ordem na região da península de Liaodong e região nordeste da Manchúria na China que faz de fronteira com Koguryo no norte da península coreana. Então haverá embates, uma tentativa de invasão e contra-ofensiva, primeiramente em 598 e haverá depois outras contra-ofensivas coreanas de Koguryo muito bem sucedidas em cima inclusive de muralhas, e táticas brilhantes do general a de Koguryo, Mundeok.

Ilustração de Mundeok
Ilustração de Mundeok

Essas guerras vão perdurar algum tempo, e na verdade elas nunca vão ser conclusivas, haverá um delicado balanço de poder na fronteira nordeste da China. Primeiramente tiveram esses embates iniciais que botaram uma certa ordem na região da península coreana com a dinastia Tang. Então na verdade quando a dinastia Tang resolve bem as suas conquistas ao Oeste sobre os povos túrquicos, na época do imperador chinês Taizong, vai ter uma série de novas ofensivas chinesas sobre a região norte da península coreana, ou seja, isso vai em grande parte recair sobre o Reino de Koguryo e haverá uma série intermitente de guerras de 645 até 668.

Então para exemplificar, temos um mapa com as ofensivas em vermelho e não somente terrestre, privilegiando aqui as ofensivas marítimas em torno da península de Liaodong, passando a região das muralhas defensivas que tinham começado a se constituir desde os primeiros séculos de nossa era, passando pelos aliados Kithans.

Então uma série de batalhas vai se dar primeiro nessa região da península de Liaodong, e vindos de Shandong eles começam inclusive no âmbito dessa guerra Tang/coreana, também a ter embates em cima do Reino mais meridional que é o de Baekje. Tudo isso vai compor então esse cenário de guerra, um dos líderes de mais destaque dos coreanos vai ser o Gaesomun. E Gaesomun se estabelece no Norte no Reino de Koguryo, e busca se aliar ao Reino de Silla, um pouco mais ao sul para tentar enfraquecer o outro Reino vizinho de Baekje. Mas a aliança não vai durar muito, Koguryo depois de se aliar, ele vai buscar outras alianças com o Império Tang. Em 644 Taizong envia uma expedição contra Koguryo, vai enfrentar duras resistências na península de Lialdong, e depois cansado de anos de guerra, Taizong finalmente resolve se retirar da política e da guerra. As linhas ofensivas chinesas parece que retraem depois de anos de guerra e o Império chinês começa a se aliar cada vez mais com o Reino de Silla, o que vai provocar cada vez mais embates entre Silla e o Reino de koguryo que mantinha a rivalidade contra os chineses.

Então é assim inicialmente que Silla ascende ao poder, temos aí já uma aliança contra Koguryo dos chineses de Tang, que é um poderio que não se podia ignorar, e foi durante esse período que acende a rainha Seondeok, membro claro, da aristocracia de Silla, que depois vai ter uma série de contestações. Quando a Seondeok vem a falecer, uma outra herdeira dela, a rainha Jimdeok, vai ser a última das monarcas de Silla que seguia o sistema de ossos que é chamado Golpum. E que nesse sentido, essas rainhas tinham a classificação óssea como sagrado, ou os chamados somgol, a gente vai ver isso brevemente, como vai ser estabelecido o Reino de Silla.

E Silla estava cada vez mais comprometido com a China dos Tangs né, então eventualmente Silla envia os seus mais a destacados diplomatas e políticos, que vai ser o Kim Chun-chu, que depois chega a ocupar o trono de Silla. Ele voltando da China, volta prometendo adotar todos os protocolos, rituais e vestimentas cerimoniais da China de Tang na corte de Silla para impressionar os chineses, isso tudo vai fortalecer ainda mais a aliança entre esses dois reinos asiáticos. Inclusive Silla já no auge do seu poderio contra o reduzido Reino de Koguryo, ganha o selo imperial chinês de um Reino independente. Claro, com alguma relação tributária.

Golpum - Sistema de Ossos de Silla
Golpum - Sistema de Ossos de Silla

Cavaleiros Hwarang


Além da política e da diplomacia lá no século VI/VII, Silla vai institucionalizar os seus cavaleiros de elite que são chamados “cavaleiros florescentes” Hwarangdo, o caminho dos cavaleiros florescentes, que eram basicamente grupos selecionados de elite, jovens da elite que tinham demonstrado coragem lealdade e respeito aos valores tradicionais e versados nas artes e poesia. Cada um desses jovens é avaliado por um Hwarang, um membro de famílias pertencente aos ossos sagrados, como por exemplo foi o caso do Kim Chun-chu, e com frequência monges budistas também se juntavam a esses grupos como conselheiros espirituais. Tudo isso retrata bem o espírito da época de valorização da cultura e do espírito de guerra de Silla que estava florescendo na península coreana. Então eu como eu falei, o Hwarang mais conhecido de Silla foi, além de Kim Chun-chu, foi Kim Yu-sin, na mesma época, ele descendia de um dos reis do extinto Reino de Gaya e foi aceito nessa casta de ossos sagrados em Silla. Kim Yu-sin vai liderar os cavaleiros Hwarangdo que achavam que poderiam conquistar toda a península coreana, e eventualmente Kim Yu-sin, chega a ocupar o trono de Silla em 654 com o nome real de Muyol. Então acho até interessante, ele era um descendente ligado a linhagem dos ossos sagrados de Gaya que tinha sido derrotado, e com as suas habilidades políticas e a lealdade dos cavaleiros, ele chega a ocupar o trono do Reino de Silla em 654 até 661.


Tumba de Kim Chun-chu e Ilustração de Kim Yu-jin (Muyol)


Outro Reino o de Baekje, que se encontrava ameaçado em várias frentes além de Silla, também contra a China da dinastia Tang. Foi então que Baekje nessa situação envia representantes para a China, e buscam outros aliados para leste, eles tentam achar novos aliados no arquipélago japonês, no Reino chamado de Wa na época, e eles renovam até uma aliança 653, Baekje com os japoneses, e Baekje também parece ter convencido Koguryo a mobilizar suas tropas contra Silla em 659. E diante disso Silla então vai para cima de Baekje, Silla consegue um apoio maior dos chineses que enviam uma força naval de 130 mil homens em direção à capital Baekje, na linha oriental essa ofensiva sob o comando do Kim Yu-sin, entre outros uma força estimada de 50 mil que vai resultar nas maiores batalhas desse período de acordo com as crônicas do século XII “Sanguk Sagi” a história dos três reinos. Nessa batalha de Hwangsanbeol vai ser narrado os sacrifícios de um dos generais de Baekje, que eventualmente sacrifica toda a sua família para evitar capturas e escravidão. Ou seja, no final das contas a soberania de Baekje é posta a termo no confronto com Silla e os aliados aos chineses de Tang.

Já na segunda metade do século VII o sucesso de Silla começa a gerar desconfianças do imperador chinês, os chineses querem uma presença definitiva na península, que já está consciente desses planos ambiciosos. E o Sanguk Sagi começa inclusive enfatizar as decisões do Reino Muyeol, para que haja uma certa soberania do Reino de Silla na península coreana. Os japoneses de Wa que eram aliados aos Baekje tiveram alguns enfrentamentos navais, mas no final das contas Baekje é derrotado, eles buscam exílio e muitas famílias reais de Baekje vão para as ilhas meridionais japonesas.

O Império Tang não tinha desistido de suas ambições na região, a China alimenta outra vez ofensivas contra Koguryo no norte, o imperador chinês em 661 vai organizar uma expedição que dizem que foi em torno de 350 mil homens contra Koguryo, a beneficiar inclusive Silla, seu aliado na época, e Kim Yu-jin a maior liderança militar de Silla, vai então ter ofensivas renovadas.

Eventualmente Silla também vai para cima de Koguryo, vindos do sul, e os chineses de Tang vindo do norte sobre Koguryo, uma das fortalezas de Koguryo, Pyongyang, resistiu duramente as investidas dessas duas partes e aí eventualmente o governo chinês resolve negociar com Koguryo e estabelece uma espécie de acordo e manda um regente local sobre a região. Isso vai gerar desgaste nos acordos feitos com a corte de Silla, e com isso tudo vai ficar então em aberto o futuro da ordem dessa região, isso já no final do século VII.

E isso vai ser ainda mais agravado depois da morte de um dos governantes de Koguryo, Pyongyang vai ser ocupada, a hegemonia em Koguryo vai ser mantida embora somente com o endosso da dinastia Tang. E Koguryo sobrevive fragilmente do século VII em diante, entre a hegemonia crescente e consolidada de Silla ao sul e o Império chinês mais a norte, noroeste. Inclusive em 669 o governo chinês estabelece em torno de Pyongyang uma região administrativa com propósito de administrar essa região fronteiriça com Silla. Essa espécie de protetorado vai ser um dos maiores do Império chinês inclusive, vai se revelar várias vezes frágil, e incerto diante das resistências do que restou de Koguryo e das desconfianças do Reino de Silla.

Enfim, parece que era inevitável que haveria uma guerra entre Silla e a China de Tang já no fim do século VII. O que felizmente revelou-se favorável a Silla, porque o imperador Tang, Gaozong, começa a se mostrar doente e a regência dele passa para uma de suas imperatrizes, Wu Zetian, que adota uma política mais pacifista.

Imperatriz Wu-Zetian e Imperador Gaozong


Entã já temos aí reflexos das rivalidades nessa região, além disso teve ascensão de outras ameaças nas fronteiras chinesas no sudoeste entre os tibetanos, e isso mudou o foco da dinastia Tang para se afastar da região nordeste da China. Mas, mesmo assim as forças de Tang foram formidáveis, elas somente vão ser derrotados por embates contra Silla em 675, ao longo da região do Rio Han e na Costa ocidental da península coreana.

O protetorado chinês ainda sobrevive no norte coreano, desloca-se ainda mais para o norte de Pyongyang e se estabelece na região da península de Liaodong em 676. Daí já temos então um avanço de Silla mais para região norte da península coreana, como sinal dos tempos inclusive, Silla começa a embelezar e organizar sua capital inspirada na capital chinesa de Xangan, que vai ser Gyeongju. Os antigos aristocratas do derrotado o Reino de Baekje, de Koguryo e mesmo da pequena Gaya, vão ser incorporados na classe dominante de Silla, então talvez Silla e sua capital sejam a primeira clara expressão unificada da península coreana. Onde tem seu auge no séculos VI e VII do Reino de Silla. Gyeongju rivalizava em sua beleza e pujança até com Xian, Xangan na época, Nara no Japão uma das cidades mais prósperas no leste asiático nos séculos VIII e IX. População estimada 200 mil pessoas, seus habitantes eram desde aristocratas, funcionários, sacerdotes, soldados comerciantes, artesãos, artistas e escravos.

O Samguk Yusa conta que as habitações eram decentes, telhados de azulejos decorados e raramente se via um telhado de palha, que significa já certa riqueza e organização do Reino de Silla, na capital. Há descrição de palácios reais cercados de jardins e lagos planejados, templos budistas presentes todos os cantos. E isso lamentavelmente vai ser quase que tudo destruído nas invasões mongóis do século XIII, e ainda mais depois das ofensivas na guerra Imjin no final do século XVI. Restam apenas algumas esculturas de pedra desse período em Gyeongju, alguns relevos, estruturas de Palácio e templo, e tanto é que mesmo assim Gyeongju hoje é declarado patrimônio cultural da humanidade pela UNESCO, foi declarado assim no ano de 2000.

Ilustração da Guerra Imjin
Ilustração da Guerra Imjin

A literatura coreana de Silla. O Hyangga e a Canção de Choyong


As narrativas crônicas reunidas no Samguk Yusa dão detalhes também do cotidiano de Gyeongju no século VIII e IX, os templos eram vibrantes, os cultos e músicas fluíam nas ruas dia e noite, há relatos de canções célebres como a canção de Choyong, no ritmo poético da época que era o chamado ritmo da composição hyangga. Esses versos eram cantados e escritos em forma Ido que na verdade era o coreano escrito em caracteres chineses. De acordo com essa canção de Choyong, conta que o filho do Dragão do Mar do Leste tinha dons mágicos, e chegou a capital para servir o regente de Silla. E o regente deu um título a ele, deu uma esposa e certa noite voltando de uma festa Choyong encontra sua esposa sendo seduzida por um espírito maligno, metáfora para os males do mundo, e Choyong chegou a perdoar todos os envolvidos mas, com promessa de que o espírito nunca mais entrasse em uma casa um retrato do herói na porta. E a canção que Choyong declama é encantadora, por exemplo, peguei uma parte aqui para vocês:

Tendo me arrastado até tarde da noite na capital da lua, voltei para casa e na minha cama eis quatro pernas. Dois eram meus (no caso os de sua esposa), de quem são os outros dois? (aí o problema da traição) Anteriormente dois eram meus, o que deve ser feito agora depois que foram tomados?

Então existe inclusive a questão da posse, do conservadorismo sobre as relações matrimoniais e a sociedade de Silla vai se estabelecer nessa época em torno de uma classificação de castas sociais de Senhores de Terra sobre camponeses muito parecido com a sociedade feudal européia da época. No topo dessa pirâmide social estavam os chamados os "ossos sagrados", pertencentes aos sagrados Seonggol que vão ocupar exclusivamente o alto comando do trono real até o fim do governo de Muyol em 661.


Depois outras famílias aristocráticas vão ter perspectiva de ocupar esses altos cargos, entre eles famílias como Park e Suk na capital Gyongju, esses membros não eram "ossos sagrados", na verdade eram considerados "ossos legítimos" ou Jingol, que poderiam governar o Reino, e assim alarga-se o acesso social dessa elite, não dos ossos sagrados mas dos legítimos, o que promove uma série de reformas burocráticas administrativas em Silla a partir do século VII.

Essas reformas são grandemente inspiradas no confucionismo que entra com força, e isso assegura lealdade e obediência ao monarca coreano e vai garantir certa ordem e paz. Em 682 já sobre o Reino de Sinmun, ele vai fundar uma academia nacional o Gukhak que vai ser a única instituição de ensino superior do Reino de Silla por séculos, e é nela que a elite dos funcionários confucianos coreanos, e também estudados na China aprendem os clássicos confucionistas. Apesar dessas reformas confucianas implementadas, o sistema hereditário ainda se mantinha nos altos cargos. Então se o confucionismo permitiu um certo acesso universal meritocrático dos seus concorrentes ao sistema de exames, haveria o sistema hereditário de privilégios com base no sistema do Golpum (dos ossos).

Silla então, é essencialmente um Reino aristocrático, não importava o quão talentosos e brilhantes eram os indivíduos, se ele não pertencia a esses membros privilegiados, ele poderia ser no máximo indicado ao cargo logo abaixo dos pertencentes aos ossos legítimos, isso quando demonstrar sua presteza e talento. Então nesse sentido aqueles que entravam na Gukhak, na academia nacional, eram aqueles que não eram pertencentes à elite dos ossos do sistema Golpum, porque eles não precisavam mostrar nenhum talento pois eles já pertenciam a essa casta hereditária de osso. Houve outros inclusive, menos ambiciosos, não pertencentes ao sistema de ossos privilegiados, que buscaram outras carreiras inclusive o sacerdócio budista, passam a ser grandes estudiosos e alguns vão para China estudar e entram nos exames universais confuncionais na China, um deles vai ser um dos maiores sábios coreanos da época o Choe Chiwon que depois volta para Silla, e se frustra por não conseguir reformar o sistema de privilégios hereditários e acaba eventualmente se retirando como eremita nas montanhas.

Choe Chiwon
Choe Chiwon

Já no final do século IX em diante, na época de Chiwon, já havia alguma tensão no sistema de Silla, entre os conservadores privilegiados hereditários e aqueles que ascendem pelo seu talento e pela sua ambição fora do sistema de privilégios dos ossos. Um dos eventos mais dramáticos narrados pelo Sanguk Sagi é por exemplo, de um brilhante general e líder naval da época Jang Bogo (745-846), que tinha origens plebeias e ascende dentro do sistema do oficialato na China Tang, e volta para Silla nomeado como comandante das forças navais coreanas para combater os piratas na região. Na verdade, mais a serviço dos chineses do que propriamente dos coreanos.

Depois vai se estabelecer essa hegemonia marítima, com a China, Coreia e o Japão ou Silla, a China de Tang e o Japão dos Yamatos. O comércio e o contato entre eles floresce como nunca, Bogo inclusive chega a ganhar o controle de uma ilha estratégica na região e acumula fortunas, sua vida chega ao fim depois que ele tenta indicar sua filha como rainha do trono de Silla, para casar com o rei do filho de Sinmun, Hyoso, indo contra o sistema dos ossos de Golpum. Ele se irrita, porque é negado, se revolta e depois é morto em 846 por um enviado da corte de Silla em sua ilha. Então é uma vida bastante agitada!

Jang Bo-go
Jang Bo-go

Wonhyo - O Sábio da Madrugada


No campo religioso, teve certa fusão das tradições budistas dos reinos coreanos em Silla, talvez foi por Silla ter sido a última a converter, ao entusiasmo budista, ela manteve a algumas práticas e valores confucionistas e também locais frente essas novidades. Depois manda com entusiasmo aprender o budismo do ramo Mahayana que prevalece em boa parte da extensão chinesa, essa vertente budista mahayana ela chega em Silla no século VII, há difusão de textos, livros e estudos traduzidos do sânscrito para o chinês, mas nem por isso haverá ainda discussões doutrinárias no Reino. É um dos maiores debates da época, como cada pessoa nasce disposta com as qualidades para atingir o estado espiritual que Buda alcançou. E alguns de Silla criticaram essa visão defendendo que os seres humanos não nascem com essa disposição fundamental para se tornarem plenamente iluminados como o Buda Shakyamuni ou príncipe Siddharta tinha feito. Um dos maiores eruditos da época, que inclusive rejeitou essa ideia de que os os seres humanos poderiam sim ter essa disposição fundamental para atingir a iluminação, tal como o budismo Mahayana prega, e um deles era o Wonhyo (617-686).

Ele vai lançar depois as bases do budismo Mahayana em Silla e também tem influências na China e no Japão nos séculos seguintes, e o próprio nome Wonhyo significa “madrugada”, porque ele nasce de uma família sem qualquer ligação aristocrática, mas o seu brilho intelectual era notável, tanto que ele se torna mestre muito cedo na vida e depois conta-se que Wonhyo caminhando, peregrinando como os sábios budistas faziam, na natureza avistou algumas abelhas e borboletas voando de flor em flor e nisso sentiu um imenso desejo por uma mulher, e aí considerando isso o rei de Silla oferece sua filha viúva a princesa Yoseok para Wonhyo e quando a caminho do Palácio da princesa, ele cai em um riacho e a princesa manda ele entrar para trocar as roupas molhadas. E naquela noite os dois vão compartilhar leito, nasce o filho deles chamado de Seol Chong, o filho vai crescer nos círculos mais aristocráticos da sociedade Silla, revelando inteligência para as letras, padronizando chinês clássico para língua coreana.


Ilustração de Wonhyo e Buda Shakyamuni


É interessante como há preocupação dos coreanos com relação a quem vai originar a escrita e os ensinamentos, muito ligado também a questão da origem das artes, do conhecimento, o que os chineses também faziam alguns séculos depois. E Wonhyo, voltando a história dele, quebrando seu voto de celibato de um monge, troca então suas vestes de sacerdote por roupas seculares e passa a dedicar sua vida à poemas e músicas para o melhor ensinamento das virtudes budistas. Ele perambulando de aldeia em aldeia, vai cantando e dançando, recita, a mensagem dele chega a milhares de pessoas desde o mais humilde ao mais nobre e até os dias atuais ele é muito citado pelos budistas coreanos.

O seu comportamento heterodoxo claro, vai ser condenado na parte mais ortodoxa dos budistas que desencoraja a dança e o canto, mas com o seu carisma, Wonhyo vai se utilizar dessas aptidões de comunicação para buscar a salvação de todos os seres vivos. E um dos episódios mais curiosos vai ser aquele narrado no episódio chamado de “bebendo água de uma caveira”, que remete uma viagem que ele faz para China, que diz que no caminho teve uma tempestade violenta e ele buscou abrigo numa caverna subterrânea. No dia seguinte ele descobre que o local que ele havia dormido na verdade não era uma caverna normal. Era na verdade uma câmara funerária, ele se depara com ossos, com um crânio, e ele então se viu incapaz de dormir lá pacificamente. No dia seguinte percebendo que as circunstâncias físicas não haviam mudado mesmo ele querendo, ele percebeu que apenas sua mente, a despeito disso, dita as condições da sua percepção. Ou seja, as circunstâncias físicas eram as mesmas, a única coisa que mudou foi a sua mente, a sua percepção acerca das circunstâncias físicas. Então isso foi um grande aprendizado que ele tirou desse episódio da caverna. Ele chega a usar esse crânio para a tomar água, então ele não dá tanta importância do significado da morte, mas sim, a mudança da percepção da sua mente a respeito dos objetos ao seu redor.

A Retirada dos Tangs, os Kithans e o reino de Parhae no século VIII


Ao norte de Silla, o Império Tang vai tendo ainda dificuldade em conquistar Koguryo e haverá também outros povos da região que começam a ter maior protagonismo como os Kithans que tinham se revoltado contra os chineses, vão limitar ainda mais o alcance da dinastia Tang sobre a região em torno do Rio Lial e eventualmente uma das lideranças dessa região, chega a organizar uma série de expedições contra os chineses na região da manchúria, e foge depois para um Reino mais ao sul e que depois vai se estabelecer como Reino de Parhae.

Parhae começa a se organizar em toda essa vastidão manchuriana, um pouco mais ao norte da península coreana e mandam representantes ao Reino de Silla para negociação, para outros povos inclusive turcos mais na vastidão siberiana. Parhae já no século VIII, cresce para consolidar várias regiões de múltiplas etnias e de muitos nômades das estepes inclusive de alguns chineses na região. O problema é que tem poucos registros desses eventos de Parhae né, temos que contar apenas com testemunhos vindos de Silla, de Tang ou de japoneses, de acordo com esses poucos fragmentos, o Reino vai ser fundado por remanescentes de lideranças de Koguryo, que tinha sido derrotado algumas décadas antes, vindos de um povo que era submetido a Koguryo chamado de Mal-gal, e esse povo Mal-gal vão ser os ancestrais dos manchús, lá na dinastia dos manchús na China, do século XVII em diante eles vão começar buscar o início das suas origens vindos de Parhae.

E acredita-se que os líderes de Parhae eram exímios cavaleiros semi-autônomos que eram apenas submetidos à autoridade central deles mesmos. Então era um Reino que vai a eventualmente estabelecer os domínios próprios, vai gerar novas tensões na região, novas relações de diálogo e poder com Silla e Tang, e isso vai ser o que é de mais destaque no século VIII nessa região norte da península coreana. Um dos personagens mais ilustres da época vai ser um dos estudiosos monges coreanos, Hyecho, ele vai fazer inúmeras viagens, ele sai da península e chega a capital Changan, visita inclusive a região portuária de Guangzhou na Foz do Rio das Pérolas, ele via navegação a pelo sudeste asiático chega ao norte da Índia onde ele encontra a fonte primária, primordial de todos escritos sânscritos do budismo.

Segue a rota onde o budismo Mahayana entrou na China séculos antes e depois resolve ir para as regiões do Império Persa, a região da mesopotâmia e ele volta pelo que era uma das rotas da seda na região de Dunhuang e novamente para a capital Changan, são anos de viagem.


Em cima à esquerda: Ilustração da Deusa Avalokyteshvara, ao lado templo de Bulguksa, abaixo a estátua do Buda Shakyamuni na gruta Seokguram, e ao lado os pagodes Seokgatap e Dabotap.


Bom isso demonstra também a efervescência do comércio coreano e chinês com o restante das regiões asiáticas, tinha produtos demandados de Silla desde a elite chinesa em Changan até mesmo nas ilhas japonesas também, mercadores muçulmanos comercializavam nas extensões asiáticas vindos do Oeste, os produtos coreanos entre os árabes eram também apreciados inclusive os árabes do século IX acreditavam que Silla era uma terra abundante em ouro, os finos têxteis e produtos fitoterápicos da Coreia eram demandados em contrapartida à demanda crescente coreana por seda, pedras preciosas asiáticas, obras escritas chinesas e outras budistas. Então foi nesse contexto que vai se revelar uma idade de ouro da dinastia Tang da China, também da corte de Silla e Parhae. Essa rede comercial vai frutificar no estabelecimento de uma comunidade trans-asiática de coreanos de Silla por toda a região, principalmente das regiões das ilhas japonesas e também na corte da China e principalmente na península de Shandong.

Há relatos inclusive de comunidades de comerciantes estudiosos na Foz do Rio Yangtzé de coreanos de Silla nos séculos VIII e IX. As artes budistas vão florescer nessa época, inumeros templos vão ser construídos nas montanhas da região em torno da capital Gyeongju, santuários, pagodes, sinos entre outros. O budismo vai revelar toda habilidade artística de Silla na arquitetura, na escultura e nas vibrantes pinturas da época. Um dos locais mais notáveis dessa efervescência vai ser por exemplo o templo de Bulguksa, o templo da Terra de Buda, e também a Gruta de Seokguram construído em meados do século VIII sob orientação de um ministro de Silla.

Essas duas edificações revelam muito do ardor do clima religioso da época e do poder influente das famílias aristocráticas de Silla, claro, além do senso estético da arquitetura e escultura dos artistas coreanos da época, são patrimônios da UNESCO declarados em 1995 nas montanhas originais mais orientais de Gyeongju são marcos que vão marcar a cultura coreana nos anos seguintes por exemplo, em Seokguram há uma estátua do Buda Shakyamuni que fica virado para o leste e de forma que ele encontra primeiro a luz do Sol nascente. Os budistas acreditam que a Terra pura, o Paraíso, fica em algum lugar sobre o Mar do Leste e o Buda Shakyamuni vai ser cercado por relevos, de pessoas iluminadas como diz a tradição Mahayana, é interessante que a tradição Mahayana privilegia pessoas iluminadas né, entre eles se destaca Avalokiteshvara que é a deusa da fé e da compaixão do budismo Mahayana, isso é muito a cultuado pelos tibetanos que consideram a deusa Avalokiteshvara como a principal do budismo tibetano Mahayana. Esse templo de Bulguksa, ele terá todas as suas estruturas já feitas e vai ter perdas depois dos embates com os japoneses na guerra Imjin no fim do século XVI, vão restar algumas estruturas além daquelas reconstruídas, alguns pagodes como o de Seokgatap e Dabotap entre outros. Todas essas construções revelam traços únicos da arquitetura budista e coreana de Silla e isso tudo depois vai ter consequências no senso estético, artístico e religioso na península coreana.

Então a para finalizar o que temos em Silla, que é o Reino mais consolidado do que hoje é a península coreana, ela vai se revelar primeiro uma sociedade aristocrática conservadora, vai revelar uma influência do budismo, na entrada do budismo na sua vertente Mahayana no Reino de Silla. O Reino de Silla abraça budismo e mantém também as tradições confucianas na estruturação burocrática dos seus funcionários, embora tenha a contrapartida de ter famílias privilegiadas no sistema de Golpum, dos ossos, de que eles não a precisavam passar pelos exames dos estudos confucianos. Mas abaixo disso haverá uma grande leva de estudantes ou de monges do Reino de Silla, seja pelo budismo ou pela via do confucionismo.

E eu trouxe no final algumas a realizações artísticas de Silla que vão marcar a cultura coreana nos séculos posteriores. Então na próxima postagem a gente vai ver o que vai acontecer nos séculos posteriores nos séculos VIII e IX em diante na península coreana. Até lá!


- Querido leitor, caso encontre algum erro ou inconsistência nos fatos narrados nesse texto entre em contato para que eu possa apurar.


Esta série de postagens sobre História da Coreia é baseada nos livros:


- O Deus e o Urso de Emiliano Unzer

- A History Of Korea de Kim Jin-wung

- A History Of Korea de Michael J. Seth

- Everlastig Flower de Keith Pratt


Acompanhe a série desde o início:


História da Coreia 3 Parte 3 *Em breve

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